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quinta-feira, 31 de julho de 2014

Reestruturação de carreira em ano eleitoral: análise jurídica


Fonte: Bordas Advogados

O Sr. Presidente da ADUFRGS solicita manifestação desta assessoria jurídica acerca da recente decisão proferida pelo TSE acerca da interpretação a ser dada à lei eleitoral no que toca à concessão de reajuste a servidores públicos no ano da eleição.
Em função da escassez de tempo para uma análise mais aprofundada, o presente parecer é dado em caráter preliminar, podendo ser complementado se assim entender necessário a Diretoria.

É o relatório. Passamos a opinar. 

A imprensa em geral tem dado destaque à questão da decisão do TSE e seus efeitos sobre recentes atos do Governo Federal que, através de Medida Provisória, alteraram os vencimentos de algumas carreiras de servidores federais, dentre as quais, os docentes. 

O que, contudo, há que ficar bem claro, e nem sempre os meios de comunicação o fazem, é que a decisão do TSE é fruto de uma consulta formulada por um Deputado, ou seja, não é nenhuma decisão que tenha por objeto diretamente a Medida Provisória 295/2006. Daí, é preciso ver com reserva qualquer informação no sentido de que o reajuste esteja suspenso. 

Vejamos o pedido formulado pelo Deputado Átila Lins:

8. Assim, considerando o erro de remissão contido no inciso VIII do artigo 73 da Lei 9.504/97, e que ‘erro material ou tipográfico pode ser suprido pelo interprete’ (STF, RE 81128, Min. Cordeiro Guerra, DJ 19.9.75), pois o ‘erro tipográfico no texto da lei, quando evidente, dispensa lei retificativa’ (STF, AI 17417, Rel. Min. Nelson Hungria, DJ 22.9.55), bem como a resposta das consultas 1083 e 1086 acima, indaga-se:
a) O inciso VIII do artigo 73 da Lei 9.504/97 ao estabelecer sua incidência ‘a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º, desta Lei’ se refere a qual dia? Ao dia 04 de abril ou à data de escolha dos candidatos em convenção (10 de junho a 30 de junho)?” 


Ou seja, não se está questionando nada, além disso: qual o prazo limite a que se refere o inciso VIII do artigo 73? 

O artigo em questão, é bom ter em mente, determina: 

Lei nº 9.504/97
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
(...)
VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.


O TSE respondeu que o prazo limite para concessão de revisão geral é 4 o dia 4 de abril. 

De início, cabe aclarar que existem várias modalidades de concessão de aumentos a servidores públicos, sendo que a revisão geral é a apenas uma delas, e, como diz o próprio nome, é geral, ou seja, devida a todos os servidores. 

Além dela existem as transformações de cargos, reestruturações de carreiras, unificação de carreiras, criação de novos cargos, criação de gratificações, majoração de gratificações, etc. Justamente pensando nestes outros mecanismos que a Constituição possui mais de um artigo que permitem majorações de vencimentos, notadamente dois: art. 37, X e art. 61, II. 

Portanto, fique registrado que a lei eleitoral se refere apenas a uma das hipóteses de majoração de vencimentos.

Retornemos à Medida Provisória que favoreceu algumas carreiras. A MP 295, especificamente no que toca aos docentes, estabeleceu o seguinte:

a. reestruturou a carreira, criando a classe de professor associado entre as já existentes classes de adjunto e titular;
b. revalorizou a titulação para fins de fixação de vencimentos;
c. majorou o ponto da GED
d. aumentou a quantidade de pontos para os aposentados antes da implantação da avaliação da GED; 

O que mais importa é o que a MP NÃO FEZ: ela não teve como base de cálculo a mera recomposição linear da inflação do período pretérito. Note-se que a MP não se limita a dar um reajuste linear a todos os docentes. Ao contrário, reestruturou a carreira e revalorizou a titulação como critério de fixação de ganhos. Isto em nada se confunde com revisão geral. 

A revisão geral, é bom ter claro, é o aumento concedido indistintamente a todo funcionalismo fruto da recomposição da inflação e tem como fundamento o artigo 37, X da Constituição Federal. 

Recentemente, a própria Advocacia Geral da União editou nota técnica a respeito do tema, com propriedade, recorda que o próprio TSE já possui decisões no sentido de distinguir o que seja “revisão geral” das demais modalidades de concessão de aumentos. Duas Resoluções do próprio Tribunal Superior Eleitoral deixam nítida essa distinção:

Resolução nº 21.054 – TSE A aprovação, pela via legislativa, de proposta de reestruturação de carreira de servidores não se confunde com revisão geral de remuneração e, portanto, não encontra obstáculo na proibição contida no art. 73, inciso VIII, da Lei n° 9.504, de 1997.

Resolução nº 21.296 – TSE Revisão geral de remuneração de servidores públicos - Circunscrição do pleito - Art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504/97 - Perda do poder aquisitivo - Recomposição - Projeto de lei - Encaminhamento - Aprovação.
1. O ato de revisão geral de remuneração dos servidores públicos, a que se refere o art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504/97, tem natureza legislativa, em face da exigência contida no texto constitucional. 
2. O encaminhamento de projeto de lei de revisão geral de remuneração de servidores públicos que exceda à mera recomposição da perda do poder aquisitivo sofre expressa limitação do art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.504/97, na circunscrição do pleito, não podendo ocorrer a partir do dia 9 de abril de 2002 até a posse dos eleitos, conforme dispõe a Resolução/TSE nº 20.890, de 9.10.2001.
3. A aprovação do projeto de lei que tiver sido encaminhado antes do período vedado pela lei eleitoral não se encontra obstada, desde que se restrinja à mera recomposição do poder aquisitivo no ano eleitoral.
4. A revisão geral de remuneração deve ser entendida como sendo o aumento concedido em razão do poder aquisitivo da moeda e que não tem por objetivo corrigir situações de injustiça ou de necessidade de revalorização profissional de carreiras específicas. 


Há outro argumento, de ordem política, que é o fato de que a reestruturação de carreira promovida pela MP 295 já vem sendo debatida há muito tempo, já tendo inclusive sido encaminhado projeto de lei ao Congresso no início do ano. Queremos com isso dizer é que não se trata de uma “benesse” sacada da manga no estertor do mandado do Presidente. Ao contrário, é fruto de campanha salarial e batalha da classe docente. 

Concluímos, portanto, no sentido de que a decisão do TSE não tem efeito prático sobre a reestruturação da carreira docente. 

Resta, porem, verificarmos se a MP em questão está ameaçada por qualquer outra norma protetora de abusos pré-eleitorais. E aqui nos deparamos com a Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Esta lei sim, ao contrário da lei eleitoral, PROIBE AUMENTOS DE GASTOS COM PESSOAL, sem fazer qualquer distinção. 
(...)
A Medida Provisória é anterior aos 180 dias que antecedem o término do mandado, razão pela qual concluímos que tampouco a LRF é empecilho à execução por parte da Administração do que foi estabelecido na MP, ou seja, não é obstáculo ao pagamento das vantagens. 

CONCLUSÃO
De todo o exposto, concluímos que a recente decisão do TSE em nada afeta a legalidade da MP 295, tampouco a Lei de Responsabilidade Fiscal.
É o parecer que submetemos à apreciação da Diretoria.
Porto Alegre, 23 de junho de 2006.
Francis Campos Bordas

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